Memória e território: mais de 7 mil fotografias compõem acervo comunitário do bairro Santa Filomena

Localizado no Grande Jangurussu, o bairro Santa Filomena, em Fortaleza, é um bairro construído com muitas lutas sociais e união dos moradores. Sua história está diretamente ligada à coletividade e à união de pessoas que batalham por voz, espaço e melhores condições para suas famílias. Essa trajetória vem sendo documentada e contada pelos próprios moradores há mais de uma década.

Quem percorre as ruas do bairro observa que, mesmo diante das dificuldades estruturais, a força da coletividade dos moradores é o alicerce dessa comunidade. Os mais antigos preservam na oralidade as histórias do povoamento do território que hoje é o Santa Filomena. Para preservar essa história, um coletivo de moradores resolveu reunir fotografias de moradores antigos e novos para criar um acervo cultural e memorial do bairro.

O projeto nasceu de um jornal comunitário em 2020, que foi interrompido durante a pandemia de Covid-19, depois virou acervo pessoal do fotógrafo e pesquisador Léo Silva, mas rapidamente se transformou em um acervo comunitário. “À medida que o material foi crescendo, passou a ser reconhecido como um acervo dedicado à preservação de fotografias, vídeos e outros documentos da Comunidade de Santa Filomena. Esse processo deu origem ao Acervo e Museu Uma Filomena, que já promoveu exposições no Museu de Arte Contemporânea do Ceará e no Museu Arena Castelão, sempre trazendo fragmentos da memória dessa comunidade”, explica Léo Silva.

“Começamos esse projeto a partir de conversas com mais de 40 moradores, muitos deles protagonistas de lutas comunitárias, e fomos reunindo fotografias, vídeos, relatos, depoimentos e matérias de jornais sobre o bairro. Hoje o acervo reúne mais de 7 mil itens. O material está sendo catalogado para o projeto Acervo e Museu Uma Filomena (AMUF)”.

Para Léo, o museu é mais do que um espaço expositivo; é um ato de amor ao território e de reconhecimento das trajetórias que construíram Santa Filomena. “Contar essa história é uma forma de preservar a luta de quem veio antes de nós. É garantir que nossas memórias não sejam apagadas”, afirma.

Luta e resistência

A comunidade surgiu como fruto do processo de migração de famílias do interior e também foi habitada por povos indígenas Pitaguary. Léo Silva explica como aconteceu o processo de formação da comunidade: “A gente é uma comunidade que nasce ali dos anos 80 para os anos 90. É o resultado do processo do êxodo rural, ou seja, da migração dos povos do interior para a capital. E aí, alguns moradores acabaram ocupando esse espaço, que é o Santa Filomena hoje, mas que na época era só em Jangurussu, ou Jaguarussu, como muitos também chamavam”.

O bairro carrega a ancestralidade dos povos originários, das famílias indígenas Pitaguary que viveram no território décadas atrás e que ainda mantêm a memória viva por meio de seus descendentes. O território também se constituiu por meio do apoio e presença de Comunidades Eclesiais de Base (CEBs), tendo recebido inclusive o bispo Dom Aloísio Lorscheider.

Léo Silva explica que a atuação de comunidades e líderes religiosos que levantam a bandeira de direitos humanos foi marcante no Santa Filomena. “Tivemos aqui o Padre Luiz, Padre Carlos, que atuavam em prol dos direitos humanos da comunidade. Nessa época, né? Nós tivemos a visita do Dom Aloísio Lorscheider, que é conhecido do movimento dos direitos humanos. Então existe esse marco na história de construção do nosso território”, conta.

O nome do bairro Santa Filomena tem origem em uma das moradoras mais atuantes da comunidade, Dona Penha. Segundo Léo Silva, ela foi uma das articuladoras comunitárias que mobilizaram ações importantes, como a chegada das linhas de ônibus ao bairro. “Ela fazia essa procissão da Santa Filomena. Saía com a Santa na rua até o espaço onde realizava a novena”, conta. Em determinado momento, Dona Penha sugeriu que o território passasse a se chamar Santa Filomena, proposta que foi acolhida por boa parte da comunidade. “Existe um bloco da ocupação do Mutirão que também se chama Santa Filomena, mas o entorno geral é conhecido como Parque Santa Filomena, devido à proposta dessa moradora”, explica.

Além das exposições fotográficas, o AMUF se propõe a realizar formações culturais e oficinas de fotografia e audiovisual para a comunidade local. O acervo está em fase de catalogação enquanto o espaço físico está sendo construído para reunir todo o acervo e será inaugurado no próximo ano.


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