Fazer o enxoval à espera de um bebê é um dos momentos mais aguardados na relação entre mãe e avó. Mas, para a cearense de Reriutaba, Maria Inês Sousa, o momento foi uma virada de chave para perceber que o racismo estrutural atingia também esse aspecto da vida.
A percepção veio a partir de uma busca por bonecas pretas para decoração do quarto de sua neta. Inês conta que, a pedido de sua filha, procurou por todo o Ceará e só conseguiu encontrar as bonecas em São Paulo, mas, ainda sim, foi impossibilitada de comprar devido o alto valor entre o produto e o frete, e foi assim que, usando suas habilidade de artesanato, ela deu início a loja ‘Bonecas Nega Benina’.
“O que me motivou foi minha filha que estava para ganhar neném e pediu para eu fazer uma decoração de bonecas pretas. E aí a gente fez uma pesquisa aqui no estado do Ceará e vimos que não tinham bonecas pretas, só tinha em São Paulo e o frete de lá era muito mais caro do que o valor da boneca em si.
Eu já fazia o artesanato, então optei por comprar o tecido e eu mesma fazer, e daí começou. Eu fiz uma decoração de quarto de bebê para a minha neta e aí expandiu para minhas amigas e outras pessoas que começaram a solicitar a compra das bonecas”, contou.
A história de Inês perpassa a ancestralidade e o geracional, já que a iniciativa foi a partir de um pedido de sua filha, porém o dom do artesanato veio por meio de sua avó, como conta a empreendedora.
“A essência de eu fazer as bonecas já é a origem da minha vó. Já vem dos antepassados fazer a construção dessas bonecas, que já comercializavam e isso se tornou o sustento da minha família, já que eu sou chefe de família. Eu não conhecia minha avó e aprendi no dia a dia, mas eu sabia que tinha um referencial que era minha avó.
Eu sabia que eu não poderia ter uma montagem daquela, fazer toda a pesquisa e não saber de onde vinha, tinha que vir de alguém, então eu herdei a origem da minha avó.”
Costura, história e pano
A história conta que as bonecas de pano eram usadas por mães que eram trazidas da África para o Brasil nos navios negreiros.
De acordo com historiadores, as mães faziam costuras nas bonecas usando pedaços de tecidos como membros, além de roupas e acessórios para presentear os filhos, que eram retirados de seus braços por colonizadores quando chegavam ao Brasil.

Maria Inês ressignifica o sentido desta história, transformando a produção das bonecas em sustento para sua família. Conforme a artesã, desde o início das produções, sua arte tem rodado o mundo.
“As bonecas têm uma saída imensa. Eu já tenho elas exportadas para Portugal, para África, Venezuela, França, além de Fortaleza e o Ceará inteiro. Então as bonecas têm uma capacidade de influenciar muito mais”, e afirma que recebe, inclusive, demandas para produção por encomenda da sua clientela internacional: “eu tenho um círculo de clientes e que continuam em contato até hoje em dia na rede social e eles sempre me comunicam quando estão vindo para Fortaleza, para o Ceará, e querem levar uma lembrancinha.”
Empoderamento negro
Cada ponto da linha na agulha furando o tecido possibilita que a empreendedora possa também furar bolhas de segmentos sociais. Maria Inês conta que atualmente usa seu dom para dar cursos voltados para mulheres negras em favelas.
“Dou cursos nas comunidades, preparando as adolescentes que têm um certo discurso em relação à sua cor, o seu cabelo. Então, dentro dessa questão racial, a gente transmite no curso a formação do ‘meu eu’, como me encontro com minha cor, como me encontro com meu cabelo.
Então, dentro dessa cultura negra, também estamos fazendo esses cursos que empoderam as mulheres negras a se reconhecerem como pessoas humanas, como empreendedoras e como artesãs também”, destaca.
Atualmente, as bonecas produzidas pela artesã cearense podem ser encontradas nas redes sociais. Maria Inês afirma que recebe encomendas, além de vender as produções em feiras para clientes do Brasil e do mundo.
O contato para a encomenda pode ser feito diretamente no instagram da artesã @mariaines.sousa.56 ou no WhatsApp da loja.
Serviço:
Nega Benina Bonecas Pretas
Encomendas: @mariaines.sousa.56 ou WhatsApp da loja
Onde: redes sociais
Por Hyago Felix

